2020 talvez venha a ser conhecido no futuro como o “ano em que o mundo parou”. Sem dúvida alguma a pandemia de Covid-19 é o maior desafio da humanidade desde a Segunda Guerra Mundial. Em questão de crise sanitária, a geração atual não tinha vivenciado nada parecido. Os problemas da economia brasileira, que já eram gigantescos, ficaram ainda maiores. A segurança privada, mesmo tendo sido considerada atividade essencial desde o primeiro decreto do governo sobre o tema publicado em março de 2020, foi atingida em cheio.
Diante dos efeitos da pandemia, as empresas brasileiras enfrentam um ano terrível. A segurança privada, assim como todas as atividades produtivas no Brasil, está diretamente ligada às oscilações econômicas e não ao aumento ou diminuição da violência, conforme muitos ditos especialistas afirmam.
Segundo dados da Polícia Federal, órgão que regulamenta e fiscaliza a atividade, em 2019, 565.163 vigilantes atuavam nas empresas de segurança privada de todo país, incluindo as orgânicas (empresas que optam por realizar a própria segurança dentro das regras estabelecidas pela Lei 7.103/1983). No final de 2020, o quantitativo de vigilantes era de 545.477, uma perda de 19.686 vagas.
O cenário em 2021 aponta para o mesmo caminho. Apenas nos cinco primeiros meses do ano, já houve uma redução de quase 20 mil (19.369) trabalhadores. Resultado influenciado, principalmente, pelo fim do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego do Governo Federal, suspenso no final de 2020 e retomado em abril de 2021. Assim, no final de maio, o número de vigilantes era de 526.108, sendo que 49% atuam na região Sudeste.
Soma-se a isso o fato de que muitas empresas de outros segmentos que contratam a segurança privada também fecharam as portas, diminuindo a demanda. Importante contratante, o setor de eventos também está praticamente parado. Os próprios governos Federal, estaduais e municipais enfrentam graves crises financeiras e têm cortado custos, muitos deles essenciais, como a segurança privada.
Outro dado que reforça a tendência de queda do segmento é demonstrado pela grande quantidade de pessoas aptas a desempenharem a função de vigilante em janeiro de 2021: 966.574, segundo dados da PF e da Associação Brasileira de Cursos de Formação de Vigilantes (ABCFAV). Ou seja, a atividade possui uma reserva de profissionais muito grande sem a oportunidade de exercer a atividade.
Toda essa situação é bastante preocupante não apenas para o segmento de segurança privada, mas também para toda a sociedade. A segurança privada é complementar à segurança pública. Atua em escolas, hospitais, órgãos públicos, indústria, escolta armada, transporte de valores, só para citar alguns exemplos.
A atividade continua sendo predominante exercida por homens, que representam 91% do total de trabalhadores. O grau de escolaridade é bem superior ao mínimo exigido pela Lei 7.102/1983, que é a 4ª série do ensino fundamental. Atualmente, 77% dos vigilantes possuem ensino superior médio ou mais. E 69% possuem entre 30 e 49 anos.
A queda no número de empresas autorizadas pela Polícia Federal é outro indicador que desnuda as dificuldades enfrentadas pela atividade de segurança privada. Em 2019, existiam 2.664 empresas especializadas e 2.017 orgânicas. Em 2020, o quantitativo ficou em 2.680 e 1.938, respectivamente. E, nos cinco primeiros meses de 2021, a redução no número de empresas registradas foi ainda maior, sendo 2.471 empresas especializadas, e 1.154 orgânicas. Um total de 3.625. Ou seja, uma redução de 21,5% nos cinco primeiros meses do ano.
O faturamento do segmento de segurança privada e transporte de valores, que inclui todas as despesas e impostos pagos e não representam o lucro, é outro indicador que teve queda em 2020, retornando ao nível dos anos de 2016 e 2017, quando os valores registrados foram de cerca de R$ 35,4 bilhões.
Em 2020, o valor estimado é de R$ 35,7 bilhões ante praticamente R$ 37 bilhões em 2019, uma redução de 3,3%. A redução foi fortemente puxada pela perda de faturamento das empresas de transporte de valores, que, analisado isoladamente, apresenta queda de redução de 13,5%.
Para se ter uma ideia da gravidade da situação, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, do IBGE, que é utilizado pelo governo como inflação oficial, foi de 4,52%, o que significa a perda de poder econômico, que se soma à redução do faturamento.
Os números voltam a escancarar uma realidade dura, que vai muito além do estrangulamento econômico do segmento. Passa pela proteção da sociedade, que é prejudicada diretamente. Mudanças são imprescindíveis e urgentes. São necessárias transformações que tenham impacto não apenas agora, mas a longo prazo.
Uma outra decisão que cabe ao Congresso Nacional é a aprovação do Estatuto da Segurança Privada. O tema foi bastante debatido e explicado no anuário do ano passado. No entanto, nada mudou. A proposta, que tramita há 11 anos e já cumpriu todo o rito legal, continua no aguardo da última votação pelo Senado Federal.
No final de 2020, após incluir a votação do Estatuto da Segurança Privada e das Instituições Financeiras na pauta de votações, o Senado decidiu retirar a matéria na última hora da lista dos projetos que seriam analisados. A decisão aumentou o sentimento de frustração de todo segmento de segurança privada.
Em tramitação desde 2010 e parado há quatro anos no Senado, o projeto de Lei vai atualizar e modernizar a Lei nº 7.102/83, que há quase 40 anos regulamenta o setor da segurança privada no Brasil. O texto, que aguarda a derradeira análise do Senado, tem o apoio das empresas regularizadas do setor, dos trabalhadores e da Polícia Federal.
A nova lei trará inovações importantes para o setor que é complementar ao da segurança pública, permitindo que as empresas possam se adequar a novas tecnologias e ferramentas, que irão possibilitar que o segmento ofereça um serviço de ainda maior qualidade e com resultados expressivos a toda sociedade.
Há ainda a questão econômica. A nova legislação cria novos nichos de atuação. Segundo estimativas, a ampliação do mercado da segurança privada pode gerar aproximadamente 150 mil novos empregos seis meses após a aprovação da nova lei. Números que podem ser fundamentais na recuperação econômica do país no pós-pandemia.
Jeferson Furlan Nazário - Presidente da Fenavist (Federação Nacional das Empresas de Segurança e Transporte de Valores)
Fonte: fontesegura.org.br/