Em 1932, há 90 anos, as brasileiras conquistavam o direito ao voto. A partir daí, pelas vozes das mulheres, a conformação masculina dos espaços políticos foi deixando de ser tratada como algo natural.
O voto é parte importante da cidadania política, mas a participação nos espaços em que as decisões são tomadas é fundamental para que ela seja exercida. Quando um grupo social é sistematicamente barrado, ainda que por práticas informais, estamos diante de um problema de representatividade importante. Se esse grupo tem que lidar com violências sistemáticas ao participar da política, o deficit democrático se apresenta de forma ainda mais evidente. O Consenso de Quito, de 2007, define a paridade entre mulheres e homens na política como “um dos propulsores determinantes da democracia”. Alguns anos depois, a Estratégia de Montevidéu, de 2016, definiria a paridade como “pilar central para gerar as condições para o exercício pleno dos direitos humanos e a cidadania das mulheres”.
O Brasil é um dos países do mundo com a menor representação feminina na política. É o 145º país no ranking da Inter-Parliamentary Union que mede a presença das mulheres no parlamento de 192 países. Enquanto países da região, como Argentina, Bolívia e México, adotaram normas para a paridade nos legislativos, por aqui temos tido dificuldades para garantir que os partidos respeitem a lei que, desde 1997, define um mínimo de 30% de candidaturas de um dos sexos nas listas partidárias. Quando as cotas passaram a corresponder a recursos equivalentes do fundo eleitoral dos partidos para as candidatas, em 2018, as reações aumentaram.
O que fazer? Em 1º lugar, precisamos nos livrar de falsos argumentos como os de que “as mulheres não querem participar” ou “o problema está no eleitorado, que não vota em mulheres”. Não temos evidências nem de um, nem de outro. Temos, por outro lado, evidências de sobra de que as mulheres têm dificuldades para construir carreiras políticas em condições de igualdade com os homens.
Eleições não são feitas apenas de esforços individuais. Sem o apoio dos partidos políticos, por meio de financiamento e de suporte nas campanhas, é difícil eleger-se. Se o ambiente político é hostil para as mulheres e a violência recai sobre as que participam, em particular sobre as mulheres negras, não é possível afirmar que as condições de participação são igualitárias. E algo que se observa menos, mas é também fundamental: a sub-representação vai além de candidaturas e cargos eletivos, existe também nos cargos por nomeação. Em 2020, 88% das pessoas eleitas para as prefeituras são homens. Quantas mulheres foram indicadas para assumir secretarias nos seus municípios? Secretarias municipais e estaduais e ministérios são elos importantes nas carreiras políticas, recusados sistematicamente às mulheres.
O compromisso com a democracia inclui o empenho em reduzir os obstáculos à participação política das mulheres, na sua diversidade, e garantir sua participação com segurança.
Por Flávia Biroli
Fonte: poder360.com.br/