NOTA FÚNEBRE ANOS DE CHUMBO
Morre aos 97 anos general Newton Cruz, chefe do SNI durante a ditadura militar
Cruz era um dos principais críticos da abertura dos arquivos da época do regime militar.
17/04/2022 09h39
Por: Carlos Nascimento Fonte: Isto è/Folha

O general Newton Cruz, de 97 anos, morreu na última sexta-feira (15), no Rio de Janeiro. Chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) durante a ditadura militar, o homem estava internado no Hospital Central do Exército, localizado na zona norte do Rio de Janeiro.

A morte do militar foi divulgada pelo Comando Militar do Leste. “Neste momento de consternação, os integrantes do CML solidarizam-se e rogam a Deus pelo conforto de familiares e amigos do General Newton Cruz”, informa o comunicado.

Cruz era um dos principais críticos da abertura dos arquivos da época do regime militar. Ele acumulou acusações por crimes cometidos durante a ditadura. Entre elas, Newton foi acusado pelo atentado a bomba no Riocentro em 1981. Na época, a ação foi planejada para causar pânico em um show pelo Dia do Trabalho, que reunia cerca de 20 mil pessoas no centro de convenções na zona oeste do Rio de Janeiro.

O plano não deu certo e culminou na morte do sargento Guilherme do Rosário, que teve uma bomba explodida em seu colo. Depois de muitos anos, Newton foi considerado coautor do atentado pelo Ministério Público Federal por não ter tomado atitudes para evitá-lo.

Confira abaixo frases de Newton Cruz em ataques à imprensa, sobre o Riocentro, a ditadura, a Comissão da Verdade e os ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff.

IMPRENSA

"Cale a boca, deixa eu falar e desligue essa droga" ao jornalista Honório Dantas, da Rádio Planalto, quando questionado a respeito da falta de democracia, em 17.dez.1983

ATENTADO NO RIOCENTRO

"Em 30 de abril de 1981, era noitinha, mais ou menos 19h, o coronel Ary [Pereira de Carvalho], que era meu chefe de operações, recebeu um telefonema do Rio. O [capitão Freddie] Perdigão foi ao DOI saber se havia alguma novidade. Quando chegou, viu um grupo que estava planejando partir para o Riocentro a fim de jogar uma bomba para marcar presença. Seria um protesto contra o que estava se passando lá. O Ary saiu dali: “Chefe, eu acabei de receber um telefonema”. Quando ele contou, eu raciocinei até dez. O que fazer? Avisar a quem?"

"Avisar o que, se eu não sabia para onde eles estavam indo, o trajeto que iam tomar, onde eles iam lançar a bomba? Como é que eu vou informar a alguém para tomar alguma providência?"

"Era impossível! Impossível! [ter evitado o atentado no Riocentro] Fui escalado o bode expiatório da revolução de 1964. Avisar a quem? Aí cerca tudo, e tal, e tinha um tumulto lá? Era o que eles queriam. Não havia nem celular nessa época. A bomba da casa de força não tinha possibilidade de prejudicar ninguém. Tanto que não foi nem ouvida no auditório. Foi um ato de presença. Não ia fazer nada. Ninguém podia fazer nada. Eu tinha que aguardar. Isso foi uma decisão minha. Minha. Tomada por minha conta, e por que eu achava que para o caso era a melhor decisão."

INOCENTES MORTOS EM ATENTADOS REALIZADOS POR MILITARES

"E daí? Descobriram? O que eu tenho com isso? Se pegarem o responsável, tinham que matar também. Matar não, mas punir rigorosamente. Ora bolas!"

DITADURA MILITAR

"Ditadura, propriamente, não era. Era um regime autoritário forte. Agora, que não era uma democracia, não era. Não existe democracia em que o presidente pode editar ato institucional. Eu acho que a revolução escolheu bem a hora de entrar, mas não a de sair. Com o passar do tempo, o cachimbo entortou a boca. Por isso, saiu escorraçada."

DOCUMENTOS DESTRUÍDOS PELA DITADURA

"Foi tudo de acordo com a lei da época. O SNI existia para assessorar o presidente da República na política do governo. É um órgão de informação, e a informação nascia de um processamento doutrinariamente resolvido. Ele cumpriu o papel dele e terminou aí."

"Documento foi destruído para você não deixar aparecer pessoas que não tinham nada [a ver] com o problema, mas que tinham sido informantes e que tinham entrado no problema sob a garantia do sigilo profissional. Esses não podiam ir adiante"

ELEIÇÕES

"Vou repetir meu voto na Dilma. Tem a Dilma no passado e a de hoje. Eu acho que ela está conduzindo bem o país. O país voltou a ser soberano, coisa que não era até o governo do Lula."

"Votei [em Lula], mas não voto mais, porque o Lula se ajoelhou diante do Paulo Maluf na eleição de São Paulo. Isso eu não posso admitir"