POLÍCIA ENTROU AR....
Ex-secretário Bruno Dauster é alvo de operação da PF sobre compra de respiradores
ENTENDA O CASO: Dauster comandava a Casa Civil durante compra dos respiradores. Em nota, ex-secretário diz que a operação da Polícia Federal foi "extemporânea e desnecessária".
26/04/2022 19h59 Atualizada há 3 anos
Por: Carlos Nascimento Fonte: g1

A Polícia Federal deflagrou, na manhã desta terça-feira (26), a "OPERAÇÃO CIANOSE", que investiga a contratação da empresa Hempcare pelo Consórcio Nordeste, para fornecimento de ventiladores pulmonares durante o pico inicial da pandemia de Covid-19 no Brasil.

Foram cumpridos 14 mandados de busca e apreensão em Salvador, no Distrito Federal, e nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro, expedidos pelo Superior Tribunal de Justiça. As buscas contaram com apoio da Controladoria Geral da União.

Em Salvador, a operação foi cumprida em um prédio de luxo no Corredor da Vitória e em outros prontos. Um dos alvos dos mandados foi Bruno Dauster, ex-secretário da Casa Civil do governador Rui Costa (PT) . O governador é um dos investigados, mas não foi alvo de mandados na ação desta terça.

O governador criticou a operação. "Eu confesso que até entenderia e bateria palma se hoje os responsáveis tivessem sido presos. Mas eu não consigo entender uma busca e apreensão dois anos depois. Alguém acha que esse povo tá com alguma coisa a mais?", disse.

             

Por meio de nota, o ex-secretário Bruno Dauster considerou a ação "extemporânea e desnecessária". Dauster diz que já prestou, de forma espontânea, dois depoimentos, um para a Polícia Civil e outro para a Polícia Federal e diz que sempre se colocou à disposição para auxiliar no esclarecimento dos fatos. 


Outro alvo da operação foi o consultor Cleber Isaac. Após a operação ser deflagrada, ele se apresentou na sede da Polícia Federal, em Ilhéus, no sul da Bahia. De acordo com o advogado Milton Ventorim Jr, responsável pela defesa de Cleber Isaac, ele entregou o celular e deixou documentos de toda as tratativas durante o processo de venda dos respiradores.

Ainda segundo o advogado, Cleber Isaac foi um consultor contratado inclusive após as negociações terem se iniciado. Ele diz ainda que seu cliente comprovará "o seu empenho para solução dessa entrega dos respiradores, mesmo não tendo gerência ou qualquer participação na empresa HempCare"

Também alvo da operação, o empresário Carlos Kerbes disse que espera que o caso seja solucionado o mais rápido possível. Em novembro do ano passado, em depoimento à CPI da Covid, do Rio Grande do Norte, Kerbes, que tem empresa de consultoria financeira, confirmou relação com a empresa Hempcare durante a pandemia.

O empresário disse que foi procurado pela empresa através de Cleber Isaac, que o conhecia devido a ações comerciais no Rio de Janeiro de 2016. O objetivo do contato da Hempcare, segundo Carlos Kerbes, era conseguir contato com fornecedores chineses para a aquisição de testes covid. As tratativas ocorreram entre abril e maio de 2020, de acordo com o depoimento de Kerbes. 

Em nota, o Consórcio Nordeste diz "foi vítima de fraude por parte de empresários que receberam o pagamento e não entregaram os aparelhos". O Consórcio diz ainda que foi o responsável pela denúncia e que segue aguardando a apuração do crime, o julgamento e a punição dos responsáveis, além da devolução do dinheiro aos cofres dos respectivos estados. 

A Procuradoria Geral do Estado da Bahia (PGE) divulgou nota onde diz que em relação à compra de respiradores, o Estado da Bahia obteve duas vitórias contra as empresas Ocean 26 INC e Pulsar. A Ocean 26 INC devolveu o valor após acordo judicial, a partir de ação movida pela Procuradoria Geral do Estado (PGE); e a Pulsar, voluntariamente, após a notificação extrajudicial feita.

A PGE diz ainda que no caso da empresa Hempcare, que teria se recusado em fornecer os bens contratados ou devolver o valor pago, foi dada a notícia crime, com instauração de investigação policial, que resultou na prisão preventiva dos envolvidos, no que ficou conhecida por Operação Ragnarok. A PGE cita ainda que o Estado da Bahia ainda instaurou sindicância para apuração dos fatos (eventuais alterações ocorridas na minuta do contrato administrativo, após a sua aprovação pela PGE), com identificação dos responsáveis. E que resultado da sindicância já foi encaminhado ao Ministério Público do Estado (MPE). 

STJ defende operação para assegurar preservação das provas

Conforme a PF, o processo de aquisição teve diversas irregularidades, como pagamento antecipado de seu valor integral, sem que houvesse no contrato garantia contra eventual inadimplência por parte da contratada. Ao fim, nenhum respirador foi entregue.

Ainda segundo a PF, os investigados podem responder pelos crimes de estelionato em detrimento de entidade pública, dispensa de licitação sem observância das formalidades legais e lavagem de dinheiro.

O nome da operação, Cianose, tem relação com uma condição de saúde que pode afetar pacientes que passa, por problemas relacionados à má oxigenação do sangue, por exemplo, por uma insuficiência respiratória ou uma doença pulmonar.

Em nota, a CGU disse que em auditoria realizada foi verificado que, "apesar dos valores envolvidos e da relevância dos equipamentos naquele momento da pandemia, não constava do processo justificativa para escolha da empresa, que se dedicava à comercialização de medicamentos à base de Cannabis, assim como qualquer comprovação de experiência ou mesmo capacidade operacional e financeira para cumprir o contrato".

Além disso, a CGU diz que auditoria constatou que o pagamento de quase R$ 49 milhões foi feito de forma antecipada, "sem as devidas garantias contratuais e sem observar as orientações da Procuradoria Geral do Estado". O órgão ainda diz que como respiradores nunca foram entregues e o contrato foi rescindido sem que houvesse a restituição da quantia paga, houve prejuízo aos cofres públicos de R$ 48.748.575,82.

De acordo com o STJ, o ministro Og Fernandes determinou a realização de buscas e apreensões de documentos, equipamentos e valores em desfavor de diversos investigados após pedido de aprofundamento das investigações apresentado pela PF, e chancelado pelo Ministério Público Federal. Segundo o STJ, o objetivo é "desvendar aparente engrenagem criminosa com diversas ramificações e envolvimento de grande número de pessoas, inclusive autoridades públicas".

Ainda segundo o tribunal, o inquérito do caso tramita sob sigilo no Superior Tribunal de Justiça (STJ), e diz respeito à Operação Ragnarok, deflagrada em 2020 pela Polícia Civil da Bahia. O STJ diz ainda que foram requisitadas informações de natureza pública da agenda de autoridades do estado da Bahia e autorizado o compartilhamento com a Controladoria-Geral da União (CGU) das informações obtidas a partir das medidas decretadas.

Ainda segundo o Superior Tribunal de Justiça, o ministro Og Fernandes considerou a medida "imprescindível em razão da necessidade de assegurar a preservação das provas, uma vez que se trata de ilícitos praticados por pessoas com conhecimento jurídico, entre os quais lavagem de capitais que, em sua própria essência, envolve a ocultação da natureza, origem e localização de recursos financeiros".

ENTENDA O CASO

O Consórcio Nordeste, formado pelos nove estados da região, foi criado em 2019 como ferramenta política e de gestão. Durante parte da pandemia, o consórcio foi responsável por compras conjuntas de alguns equipamentos de combate à Covid-19 para estados. A entidade foi responsável por viabilizar a compra de respiradores para pacientes internados ainda em março de 2020. No entanto, os anúncios de compra dos equipamentos foram seguidos de problemas.

Em abril de 2020, o governo da Bahia, que na época presidia o consórcio anunciou que a compra de 600 respiradores de uma empresa chinesa. Dias depois, o governo anunciou que a compra foi cancelada unilateralmente pelo vendedor. A assessoria do Consórcio Nordeste informou que a carga ficou retida no aeroporto de Miami, nos Estados Unidos. Na ocasião, o valor do contrato era de R$ 42 milhões.

Em maio de 2020, a Justiça determinou o bloqueio dos bens da empresa HempShare. A decisão foi tomada após uma ação aberta pelo Consórcio Nordeste. O Governo da Bahia chegou a abrir um processo administrativo com a finalidade de apurar irregularidades praticadas pela empresa Hempcare, com sede em São Paulo.

Em junho de 2020, Bruno Dauster admitiu que não foram cumpridos diversos procedimentos obrigatórios na condução dos contratos dos respiradores que não foram entregues ao Consórcio Nordeste. Na ocasião, ele negou que tivesse recebido qualquer valor para intermediar as negociações.

No mesmo mês, três pessoas foram presas durante uma operação da Polícia Civil da Bahia contra a empresa Hempcare, que vendeu e não entregou respiradores ao Consórcio do Nordeste. Além das prisões, a operação Ragnarok cumpriu 15 mandados de busca e apreensão em Salvador, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Araraquara (SP).

Durante a operação, foram detidos o empresário Paulo de Tarso, a dona da Hempcare, Cristiana Prestes, e o sócio dela, Luiz Henrique Ramos. O trio foi liberado no dia 7 junho, após prestar depoimentos.

Na mesma semana, Bruno Dauster pediu exoneração da secretaria da Casa Civil. Na ocasião, ele falou sobre o pedido de demissão do cargo.

"Primeiro que eu não precisava de ter foro privilegiado, porque eu não cometi nenhum ato ilícito nem nada que pudesse justificar que eu tivesse medo de alguma ação na Justiça. Se tivesse, eu não teria pedido nunca, para manter o foto privilegiado", disse Bruno.

"Em segundo lugar, eu pedi porque não queria que fosse politizado essa questão, pedi antes que meu nome fosse citado por qualquer pessoa porque eu pedi na abertura do processo. O que eu queria era evitar a politização que, infelizmente, aconteceu e estamos em um momento que tudo está sendo politizado", completou.

Também em junho de 2020, a Procuradoria Geral do Estado da Bahia (PGE-BA) entrou com medidas administrativas e judiciais junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), para tentar reverter a decisão que encaminhou para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) o processo de investigação a respeito do contrato firmado pelo Consórcio Nordeste com a empresa Hempcare para a entrega de respiradores.

Na ocasião, a Hempcare prometeu devolver os R$ 48,7 milhões investidos nos 300 respiradores mecânicos que não foram entregues. Porém, em entrevista exclusiva à TV Bahia, o empresário Paulo de Tarso, sócio da Biogeoenergy, empresa que fabricaria os equipamentos, declarou que gastou com insumos os cerca de R$ 24 milhões que recebeu de Cristiana Prestes, a dona da Hempcare, que intermediou o processo.

O empresário afirmou que não devolveria o valor investido. O empresário afirmou que gastou totalmente os R$ 24 milhões para poder começar a fabricar os respiradores e acusa o Consórcio Nordeste de não aceitar os equipamentos produzidos pela Biogeoenergy.

O mês de junho de 2020 teve outro problema com empresas e a venda de respiradores. A empresa Pulsar devolveu ao Consórcio Nordeste o valor de US$ 7,9 milhões, referentes à compra de 750 respiradores. A Pulsar não conseguiu cumprir o prazo de entrega dos equipamentos. Por esse motivo, o governador da Bahia solicitou a devolução dos valores.

Em julho de 2020, O Ministério Público federal (MPF), através do procurador da república Fernando Túlio da Silva, determinou a abertura de inquérito civil para apurar uma compra de respiradores pelo governo da Bahia e Consórcio Nordeste junto à empresa Pulsar.

Em novembro de 2021, durante a CPI da Covid do Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte, o ex-secretário da Casa Civil da Bahia, Bruno Dauster, foi convocado para prestar depoimento na condição de investigado. No entanto por garantia judicial decidiu não responder às perguntas dos deputados.

O QUE DIZEM OS CITADOS

Bruno Dauster, ex-secretário da Casa Civil da Bahia

"No dia de hoje fui surpreendido com uma medida de busca e apreensão absolutamente extemporânea e desnecessária. Esclareço que acerca dos fatos objeto de investigação já prestei, de forma espontânea, dois depoimentos, sendo um perante a polícia civil e outro perante a polícia federal, bem como sempre me coloquei à disposição para auxiliar no esclarecimento dos fatos. Reafirmo que, ao longo de toda minha vida profissional, sempre agi de forma lícita, com absoluta transparência e rigor ético. Minha atuação no caso objeto de investigação foi exclusivamente para que pudéssemos ter ventiladores para as UTIs dos nossos hospitais durante a grave crise da Pandemia, no momento em que a carência deste equipamento se dava em uma escala global nunca antes imaginada.

É inaceitável qualquer tentativa de fraude ou golpe contra o Estado, ainda mais num período de pandemia, quando havia uma urgência absoluta para poder salvar vidas. Espero que os fatos sejam esclarecidos o mais rapidamente possível e que sejam caladas as vozes que tentam deturpar a minha atuação."

Cleber Isaac, através do advogado Milton Ventorim Junior

"Cleber Isaac compareceu na sede da Polícia federal em Ilhéus de forma espontânea. Entregou o celular dele e deixou documentos de toda as tratativas durante o processo de venda dos respeitadores. Cleber Isaac foi um consultor contratado inclusive após as negociações terem se iniciado e comprovará o seu empenho para solução dessa entrega dos respiradores, mesmo não tendo gerência ou qualquer participação na empresa HempCare."

Carlos Kerbes

"Na manhã de hoje, Carlos Kerbes recebeu a Polícia Federal na sua residência, que estava cumprindo o mandado de busca e apreensão, na ocasião, objetivando ajudar nas investigações, ele, voluntariamente, passou a senha do seu aparelho celular e notebook, a fim de dirimir qualquer questionamento em relação à sua conduta. Esperamos que este caso seja solucionado o mais rápido possível para que a vida de Carlos Kerbes possa volta à sua normalidade".

CONSÓRCIO NORDESTE

"Em decorrência da Operação Cianose, realizada pela Polícia Federal nesta terça-feira, 26/04/2022, informamos que a aquisição conjunta de ventiladores pulmonares pelo Consórcio Nordeste foi realizada logo no início da pandemia, tendo como fundamento o art. 4º da Lei nº 13.979/2020, em processo administrativo que observou todos os requisitos legais. No entanto, o Consórcio foi vítima de uma fraude por parte de empresários que receberam o pagamento e não entregaram os aparelhos, fato que foi imediatamente denunciado pelo próprio Consórcio Nordeste às autoridades policiais e ao judiciário, através de ação judicial, que resultou na prisão desses empresários e no bloqueio de seus bens. O Consórcio Nordeste segue aguardando a apuração desse crime, o julgamento e a punição dos responsáveis e a devolução do dinheiro aos cofres dos respectivos estados".

PGE-BA

Em relação à compra de respiradores, o Estado da Bahia conquistou duas vitórias contra as empresas Ocean 26 INC e a Pulsar. A Ocean 26 INC devolveu o valor após acordo judicial, a partir de ação movida pela Procuradoria Geral do Estado (PGE); e a Pulsar, voluntariamente, após a notificação extrajudicial feita. Além disso, todos os esforços foram esgotados no âmbito administrativo no sentido de apurar as responsabilidades.

A PGE também acompanha a situação quanto à compra dos respiradores pelo Consórcio Nordeste da empresa Hempcare. Logo após a recusa da empresa em fornecer os bens contratados ou devolver o valor pago, foi dada a notícia crime, permitindo a imediata instauração de investigação policial, que resultou na prisão preventiva dos envolvidos, no que ficou conhecida por Operação Ragnarok. Também se ingressou com ação ordinária cível para lograr bloqueio dos bens localizados em nome da empresa e de seus representantes e, após, obter a devolução do valor pago. As providências tomadas contra os indiciados fizeram com que seus advogados de defesa buscassem a formalização de um acordo para a devolução do pagamento feito pelos equipamentos que não foram entregues.

Entretanto, antes que as negociações avançassem, em uma medida surpreendente, o Ministério Público Federal (MPF) assumiu a apuração do caso, com envio para o Superior Tribunal de Justiça (STJ), e os indiciados foram liberados.

No campo administrativo, o Estado da Bahia ainda instaurou sindicância para apuração dos fatos (eventuais alterações ocorridas na minuta do contrato administrativo, após a sua aprovação pela PGE), com identificação dos responsáveis. O resultado da sindicância já foi encaminhado ao Ministério Público do Estado (MPE).

O Consórcio Nordeste, à época liderado pelo Estado da Bahia, também instaurou processo administrativo sancionatório contra a empresa Hempcare, na qual foi já ela condenada e hoje está impedida de negociar com qualquer ente público.

Fonte: g1