O Senador Angelo Coronel (PSD) apresentou no mês passado uma proposta que prevê uma alteração nas audiências de custódias no Brasil. O Projeto de Lei nº 1286/2022 altera o artigo 310 do Decreto-Lei nº 3.689, de 03.10.1941, do CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, para tornar obrigatória a audiência de custódia apenas nos casos em que o acusado não é reincidente ou tem bons antecedentes.
“O projeto visa fortalecer as polícias, principalmente a Polícia Militar, que tem um papel fundamental em dar segurança à sociedade, mas só que eles prendem os bandidos e quando chegam na audiência de custódia, o juiz solta. Estamos aqui tentando tramitar com a máxima urgência para ver se a gente aprova para que com isso possamos fortalecer a polícia e reduzir bastante a criminalidade que temos no Brasil, inclusive em Salvador. Só quem irá para a audiência de custódia é aquele bandido que é calouro, que nunca praticou nada. O reincidente tem que ficar preso”, justificou o Ângelo Coronel.
O parlamentar baiano reforça o coro de autoridades que são contra a ferramenta judicial e que atribuem às audiências de custódia o aumento da criminalidade no país. Um crítico rotineiro da medida é o governador Rui Costa. Em Feira de Santana na semana passada, o petista comparou o processo de prisão e consequente soltura de criminosos com o ato de “enxugar gelo”.
Em 2018, o governador foi rebatido pela Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Bahia (OAB-BA), após dizer que, com as audiências, “virou um ciclo de prende e solta e tem muita gente ganhando dinheiro com isso, os advogados gostam desse negócio”. Em resposta, a OAB afirmou que a medida é um “direito fundamental, previsto nas mais importantes convenções internacionais de direitos humanos”
Quem também atacou a medida foi o Comandante-Geral da Polícia Militar da Bahia, Coronel Paulo Coutinho. Em entrevista recente para o programa Isso é Bahia, da rádio A Tarde FM, o militar sugeriu mudanças e disse que o atual modelo precisa ser “repensado”.
A insatisfação com a ferramenta jurídica não fica restrita a Bahia. O tema foi debatido, na quarta-feira (01/06), na 82ª Reunião Ordinária do Conselho Nacional de Secretários de Segurança Pública (CONSESP), realizada na cidade de Manaus. Na ocasião, os Secretários de Segurança Pública dos 26 estados brasileiros e do Distrito Federal cobram critérios da Justiça, na liberação de presos em flagrantes.
"É de extrema urgência esse debate com o judiciário. Importante que a população e a imprensa participem. O fardo da violência recai somente sobre as polícias, que trabalham muito e prendem muito. Na Bahia, de 1° de janeiro a 10 de maio, foram capturados 4.788 criminosos (média de 36 prisões por dia)", destacou o Secretário Ricardo Mandarino.
DEFENSORIA PEDE DIÁLOGO
Em nota, a Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE) disse entender o desejo de mudança proposto por Ângelo Coronel, mas discorda da projeto. O órgão justifica que as audiências garantem a qualquer pessoa presa o direito de ser conduzida sem demora à presença de um juiz; de ser ouvida sobre as circunstâncias da sua prisão; e de ser avaliada a necessidade de permanecer custodiada ou responder em liberdade. A DPE ressalta que a obrigatoriedade de ser levada de imediato ao juízo também auxilia no controle de maus tratos e tortura.
O argumento de reincidência, muito usado pelos críticos que pedem alterações nas audiências, é rebatido com dados que indicam que as pessoas liberadas raramente voltam a incorrer em novos flagrantes. Segundo a Defensoria, as taxas de retorno em um ano em Salvador são de menos de 4% entre 2015 e 2018. Em 2019, o retorno foi de 7,2% e em 2020, foi de 6,1%.
“A Defensoria da Bahia possui um dos maiores bancos de dados sobre audiências de custódia do Brasil e registra todas as audiências que aconteceram em Salvador, desde a sua implementação, em 2015 e pode contribuir bastante para os debates em torno do PL 1286/2022, que tem a reincidência como fator de destaque", ressaltou a DPE.
“Os cidadãos precisam confiar no Poder Judiciário, que tem competência natural e expertise para avaliar sobre a conveniência ou não da prisão. Além disso, o Ministério Público também participa das audiências e pode discordar das decisões de soltura, recorrendo ao Tribunal de Justiça, que pode determinar a prisão”, reforçou.
O relatório feito pela Defensoria, ainda mostra que em 2020, a suspensão de audiências de custódia na pandemia provocou a subnotificação de 84% dos relatos de tortura e maus tratos durante as prisões, o que mostra, segundo o órgão, a importância das audiências para o controle de maus tratos a pessoas presas.
A Defensoria informa também que atua em mais de 60% dos processos das pessoas que são presas em flagrante. Um relatório feito com base nestes atendimentos mostrou que o perfil social do flagranteado em 2019, na capital baiana, corresponde a homem (93,2%) negro (97,8%), jovem (65,3%), com ensino fundamental incompleto (53,3%) e com renda mensal de até dois salários mínimos (98,6%).
“O objetivo com essas pesquisas que a Defensoria entrega para a sociedade é que o sistema penal e as políticas de segurança pública sejam discutidas. A possibilidade de entender esse contexto social, de o juiz ouvir e olhar nos olhos do acusado e não apenas ver o processo físico ou digital, faz toda diferença numa sociedade humanitária”, finaliza a nota.
Sindicalista se manifesta: O Projeto de Lei do Senador Coronel, “NÃO É BOM E NÃO PASSA”
Para o ex-Presidente do Sindicato dos Policiais Civis da Bahia, Crispiniano Daltro, o Projeto de Lei de autoria do Senador Ângelo Coronel (PSD/BA), não é bom e não passa. O que deve ser feito na verdade, é a Polícia Judiciária - Polícia Civil, não dar flagrante desnecessário, mas sim os delegados deixarem de preguiça e requerer ao juiz pela prisão do detido para investigar e instaurar o INQUÉRITO POLICIAL.
É isso que deve ser feito, conforme o relatório dos Investigadores designados e conclusão do relatório final apresentado pelo delegado responsável pela finalização do inquérito..., aí sim poderá requerer do juiz prorrogação de 5 ou 30 dias...
Esse negócio de dizer que a polícia está enxugando gelo, porque prende e a justiça solta, é uma justificativa esfarrapada, de quem não sabe trabalhar e não tem competência para a atividade, pois na maioria são "flagrantes moldados, denominados de flagrantes continuados", quê praticamente é nulo, por não está previsto em lei esse tipo de crime.
É por essa razão que o juiz não vê outra alternativa, senão soltar o detido.
Crispiniano Daltro
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