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ELEITOS EM 2022 PODEM REPRESENTAR O ESVAZIAMENTO DE PAUTAS CARAS AOS POLICIAIS:

A bancada da segurança pública aumentou, mas não necessariamente em favor dos trabalhadores do setor.

16/10/2022 às 19h17 Atualizada em 16/10/2022 às 19h22
Por: Carlos Nascimento Fonte: fontesegura.forumseguranca.org.br/
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ELEITOS EM 2022 PODEM REPRESENTAR O ESVAZIAMENTO DE PAUTAS CARAS AOS POLICIAIS:

No primeiro turno das eleições 2022, a corrida pela conquista dos votos por parte de candidatos associados ao campo da segurança pública refletiu a consequência da difusão de estímulos sobre a atividade policial, por meio dos canais de comunicação das massas na atualidade, as redes sociais. Além do apoio dos policiais, as candidaturas receberam apoio de simpatizantes da categoria, que engrossaram o time de seguidores, assíduos espectadores da atividade policial em formato de espetáculo da vida real.

Enquanto alguns candidatos às esferas parlamentares defenderam projetos políticos de segurança pública capazes de responder às demandas da categoria, outros disputaram projetos de poder deslocados do anseio coletivo. Os últimos ocuparam mais cadeiras nas Assembleias Legislativas e na Câmara dos Deputados. A bancada da segurança pública aumentou, mas não necessariamente em favor dos trabalhadores do setor.

Com isso, corre-se o risco de que a defesa das pautas importantes à categoria dos policiais seja omitida, em detrimento das pautas defendidas durante o período eleitoral, como a desburocratização do acesso das pessoas não vinculadas às forças de segurança a armas de fogo.

O incremento de parlamentares descomprometidos com a categoria tende a impactar, diretamente, as demandas policiais relacionadas às condições de vida e ao cotidiano de trabalho, especialmente daqueles que atuam na linha de frente da prestação de serviços à comunidade. Nesse sentido, algumas lutas são enfraquecidas, dada a permanente tensão da relação institucional com os sindicatos e associações de classe, o que envolve a valorização salarial, a visibilidade do assédio moral e sexual no trabalho, além do medo de punições.

A espetacularização da atividade policial, à medida que produz engajamento virtual, desumaniza o profissional envolvido na ação em destaque. Se, por um lado, parece aproximar setores da população à realidade da segurança pública, de outro produz expectativas irreais sobre a performance dos policiais, produzindo uma imagem distorcida sobre a profissão, suas competências e atribuições. Com a chancela de parte importante dos profissionais da segurança pública, nas eleições 2022 foi validado o discurso mais radicalizado que foca nos “esforços à destruição do mal” e na pauta dos costumes.

Noutro sentido, pontos importantes aos policiais como classe trabalhadora e, em regra, restritos aos espaços internos das instituições, a exemplo das jornadas de trabalho extenuantes e do assédio moral, devem ser esvaziados dos debates nos próximos anos.

O assédio moral no trabalho, por exemplo, não é algo novo, mas vem se intensificando nos últimos 20 anos. Isso porque não se trata apenas de um agente assediador, mas de um sistema que permite que o assédio cresça e se perpetue no âmbito das instituições, o que envolve a naturalização das pressões, ameaças veladas, boicotes, isolamento ou sobrecarga de trabalho. Somam-se a esta prática as políticas de gestão por medo que aterrorizam quem está em torno do alvo da vez, gerando sua omissão diante da injustiça, pelo temor de ser o próximo da lista. Em regra, o trabalhador assediado é estigmatizado, subjugado, alvo de fofocas, acusações infundadas, tem sua imagem maculada e, ao buscar ajuda, é desacreditado.

O processo de assédio moral tem quatro fases:

1) conflito (a pessoa diverge de posicionamentos organizacionais e ocorrem mudanças negativas nas relações interpessoais;

2) estigmatização (o indivíduo é isolado ou se isola do contato com colegas);

3) intervenção da instituição (a chefia direta tende a negar a situação, foge do problema e culpa o assediado);

4) marginalização (a pessoa pede demissão, a dispensa ou afastamento para tratamento de saúde).

O assédio integra situações cotidianas que provocam ansiedade, desestabilização emocional, desmotivação e perda de produtividade. Afeta mulheres e homens, que expressam suas dores de formas diferentes. Mulheres, com crises de choro, transtornos alimentares e sentimento de inutilidade. Os homens, pelas vias do sentimento de vingança, consumo imoderado de álcool e ideias suicidas.

Episódios repetitivos, que diminuem o profissional, o humilhem, o desmereçam, que perdurem por meses ou anos, caracterizam o assédio moral. A base do assédio é a forma de organizar o trabalho e a cultura da organização. Cabe à instituição (privada ou pública) tomar medidas que deem conta de inibir esse processo, mas, especialmente nas corporações verticalizadas, como é o caso dos militares, o “basta” não costuma ocorrer de modo espontâneo.  O que garante a perpetuação do assédio por longos períodos, condicionando a perda de produtividade e o adoecimento mental dos profissionais.

Antes de mais nada, proteger a sociedade constitui um dever das forças de segurança e a garantia dos direitos humanos da sociedade e também dos profissionais constitui obrigação do Estado. No entanto, a tônica é a meta e o mecanismo é a pressão. O que ocorre intramuros, pouco acessível ao público externo, com exceção de familiares que conduzem um pacto pelo silêncio, de modo a evitar retaliações ao policial no seu ambiente de trabalho.

Nesse sentido é que importa tanto a representatividade da categoria nas assembleias estaduais e Câmara dos Deputados. Os interesses das forças que integram a segurança pública permeiam não apenas o fomento à aquisição estatal de logística compatível com a realidade do país no que tange ao armamento e equipamentos;  não apenas a criação de legislação para o público demandante dos serviços da polícia. Trata-se, ademais, da melhoria das condições de trabalho, com respeito às demandas comuns, bem como das demandas individuais possíveis de serem atendidas, dada a especificidade das atividades desempenhadas pelas forças de segurança.

JULIANA LEMES DA CRUZ - Doutoranda em Política Social pela UFF; Assistente Social e Mestra em Saúde, Sociedade e Ambiente pela UFVJM; Membro do GEPAF/UFVJM; Coordenadora do Projeto Mulher Livre de Violência; Colaboradora do INBRADIM; Professora de Ensino Superior; e Cabo da Polícia Militar de Minas Gerais, lotada em Teófilo Otoni.

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