Salvador amanhece triste no dia de seu aniversário. O que deveria ser uma manhã festiva em decorrência das festividades de fundação, Salvador acordou triste com o episódio ocorrido no Farol da Barra, onde um Policial Militar em surto psicótico com uniforme operacional, aparentando estar entrando de serviço, portando uma MT 40, e uma pistola também .40, equipamentos de trabalho ordinário e ostensivo, usado no dia a dia pelos policiais.
Não tenho a intenção de julgar a atitude do policial, o que tentaremos fazer é uma análise especulativa observada como espectador, porem com olhar de especialista, desprovido de corporativismo ou de conotação política partidária. Mas, como policial que sou, é quase uma obrigação meu posicionamento.
Inicialmente analisaremos algumas questões sobre a situação, o policial trabalhava a 250 km aproximadamente do local do evento, em carro próprio, conforme apurado ele estaria assumindo serviço, policial chega ao Farol da Barra, estaciona e demonstra que não está em seu estado normal ao atirar para o alto, se instala a crise, as primeiras viaturas chegam ao local, nenhuma ação hostil contra os colegas é esboçada por parte do policial, mais disparos para o alto, palavras de ordem são proferidas, pedido da presença de colegas de turma, não havendo mais exigências.
Todo policial sabe o clima em locais, que se instalam circunstâncias como a referida, o Grupo de Operações Especiais é chamado, ao chegar segundo o comando foi aberto às negociações, também se especula de não ter havido negociação, fato é que, entre o tempo do início e a chegada do Bope, alguém deve ou deveria ter mantido contato com o policial, isso para mantê-lo calmo, ou manter a situação controlada.
A doutrina reza como principal objeto na negociação é a preservação da vida, e prega o seguinte para isso deve-se negociar, negociar e negociar, podendo levar horas ou até dias, o que se observou foi, um tempo curto para uma negociação desse nível, o policial usava armas da corporação, portanto a quantidade de munição utilizada era previsível, já que os disparos efetuados foram para o alto, em negociações se busca atender exigências exeqüíveis, houve um pedido de falar com colegas de turma, não atendido, já vimos o próprio Bope em situações de crise, inclusive com reféns, a apresentação de familiares do criador da crise, exemplo crise no Nordeste de Amaralina, duas vezes com os mesmos autores, com refém e em local fechado. Voltando a Barra, o policial se encontra em local aberto, totalmente vulnerável, o policial em nenhum momento atirou contra prédios ou pessoas, não colocando pessoas da região em perigo.
O que nos leva a concluir sobre a morte de Wesley, que a negociação não evoluiu ao nível de exaustão do causador da crise, busca de elementos que diminuíssem a tensão como o atendimento daquelas exigências despretensiosas, como não existia reféns, poderia ser negociado a troca de armamento, Wesley não parecia apresentar um quadro de suicida, haja vista que não se salva um suicida atirando nele, outra observação são os excessos de tiros, pode-se observar que após o primeiro tiro, quando Wesley cai à equipe progride disparando de forma incessante no policial caído, que não esboça nenhuma reação, cena clara que pode ser vista nas filmagens.
Resumindo foi uma operação caracterizada pela sua forma relâmpago de solução, com o provocador da crise, mesmo sem demonstrar o perigo que se quer apresentar de forma midiática morto, excesso de disparos por parte da força de contenção e resolução da crise. Nossa observação foi à rapidez de calar a voz de um profissional de segurança pública, seu problema é o problema da massa policial seja Militar ou Civil, nos matamos não um herói, mas um trabalhador que não saberemos com exatidão o que o levou a surtar, se perseguições, assédios moral, excesso de trabalho com escalas exaustivas, salários achatados e congelados, falta de valorização, direitos desrespeitados, além de serem amordaçados por regulamentos e leis que obriga o policial a se calar sem direito a pleitos ou reivindicações, calamos um trabalhador da segurança pública, doente, surtado, humilhado, desmoralizado, desqualificado, matamos um policial, como se mata um cachorro raivoso, executamos o policial Wesley Soares Góes, em praça publica em um espetáculo mórbido e de incapacidade de socorrer um dos seus quando esse pediu, que talvez tenha sido a única forma de ser ouvido que ele vislumbrou, colocou sua farda com todo seu material de trabalho diário, viajou 250 km, se postou diante de um dos maiores cartões postais da Bahia, e tentou do seu jeito ser ouvido, como não apresar a morte desse trabalhador da segurança pública, para que não desse tempo de sabermos a verdade, para que outros colegas não se juntassem a ele, mas, aqui vai o aviso, os policiais, profissionais de segurança pública estão doentes e pedem socorro.
E não me mate por isso, só peço que por favor me escutem.
Marcos Souza - Investigador de Polícia Civil.
Especialista em Segurança Pública Justiça e Cidadania.