Longe do contato com seres humanos,
protegidas por contenções de cimento
que as mantinham reclusas naquele espelho d'água,
tendo para si a exclusividade de água permanentemente pura,
sem o risco de lhes faltar a sua ração,
a vida parecia assegurada por sabe-se lá quantas décadas.
Encerradas naquele cubículo cimentado,
ali onde militares em constante revezamento pareciam afastar qualquer proximidade de estranhos,
parecia certo que nenhum risco delas se aproximaria.
Muitas centenas de quilômetros ao sul do Território Yanomami,
jamais as águas em que há muitos anos flutuavam
poderiam tornar-se impuras.
Quem imagina que não sobreviveriam?
Até a pandemia foi uma realidade distante
que não atingiu as carpas do Palácio.
Aqueles frágeis seres decerto sonhavam com uma vida quase eterna.
Nunca poderiam supor que o seu único risco estava nas milhares de moedas que forravam o piso da sua piscina.
Quantos anos se passaram sem que elas despertassem a ambição dos inquilinos do Palácio.
Mas há quem não resista a tudo que lembre fortuna.
E, se não foram atingidas pelo mercúrio do garimpo ilegal
ou pela falta de oxigênio causada pela covid,
as carpas do Palácio também não resistiram à falta de respiração
que lhes traria a avidez despertada por aquelas moedas com que antes dividiam tão harmoniosamente sua morada.
Fernando Tolentino de Souza Vieira - Administrador público (UFBA) Jornalista (CEUB) Ex Diretor Geral da Imprensa Nacional nos governos de Lula e Dilma (2003- 2015).
E-mail: tolentino.vieira@gmail.com