Pergunte a um militante do PT o que acha de uma "dobradinha" Lula-Alckmin e sentirá a antipatia. Coisa de parecer que não despertará entusiasmo durante a campanha.
A incompreensão é maior ainda em face dos atuais índices de Lula nas sondagens de opinião, parecendo revelar que o ex-presidente já alcançaria a vitória sem precisar acrescentar apoios de outros políticos.
Mas o arrepio é maior por lembrar a composição com que se elegeu Dilma Rousseff, acompanhada da figura torpe do invejoso e traiçoeiro Michel Temer, que não vacilou ao surgir a oportunidade para conspirar e apoderar-se do seu cargo.
O receio não leva em conta as diferenças entre Lula e Dilma. Ela parecia se enojar diante da necessidade de travar relações no meio parlamentar, especialmente se fosse o caso de negociar com o centrão. Ao contrário, Lula é um craque nesse tipo de articulações. Tanto que Dilma lançou um apelo para que, na Casa Civil, tentasse salvá-la da maré golpista. Aliás, foi justamente o reconhecimento dessa sua habilidade que levou ao impedimento de que opera-se como ministro de Dilma, viabilizando-se o golpe "com o Supremo com tudo".
Ora, se Lula, como ministro era visto (e temido por adversários e inimigos) como capaz de manobrar com sucesso nesse pântano, por que nós, a militância, não confiarmos nisso quando é ele quem tem o comando em suas mãos?
Certo é que não cai todo dia do céu um político como José de Alencar, o vice dos sonhos, que acompanhou Lula em seus dois mandatos.
Mas vamos lembrar que não faltou quem torcesse o nariz quando da sua indicação. E que ela trouxe na bagagem nada menos que o PL, esse mesmo do repugnante Valdemar Costa Neto e que recebe agora a filiação do genocida, que ninguém quis aceitar. Junto veio o PTB. Essas adesões são tidas como as verdadeiras causadoras do chamado "mensalão", termo por sinal cunhado por Roberto Jefferson para desviar de si a atenção pelo escândalo da corrupção nos Correios.
Há outro fator a considerar. O nome de Alckmin estaria sendo oferecido pelo PSB, legenda com a qual o PT discute a formação de uma federação partidária. Além de normalmente tida como do campo da esquerda, apesar de frequentes escapadas de um ou outro de seus parlamentares em votações de interesse crucial para os setores progressistas.
Outro argumento de peso foi trazido por Marcos Coimbra, presidente do Instituto Vox Populi, empresa especializada em pesquisas de opinião, em entrevista à TV 247:
"Todas as vezes que o PT concorreu com um candidato a vice na esquerda, o PT perdeu a eleição. Todas as quatro vitórias que o PT obteve ele teve vices de partidos de centro. É mais ou menos de se esperar que uma pessoa com a experiência do Lula se lembre dessa história”.
Ao lado disso, há um atrativo importante nas companhias do PSB e, ainda mais, de Alckmin. Caso saia candidato ao governo de São Paulo, dizem atualmente as pesquisas que teria eleição praticamente assegurada. Se abrir mão dessa disputa para integrar a chapa de Lula, as mesmas pesquisas dão como provável vitorioso Fernando Haddad, do PT.
Não é pouca coisa. A expressividade da eleição de São Paulo pode contribuir para vitórias de governador do PT e dos partidos politicamente alinhados também em outros estados.
E, o principal, pode ajudar a reduzir uma grande preocupação de Lula e que deveria ser de todos nós. Uma campanha bem sucedida é capaz de propiciar a eleição de bancadas maiores para a Câmara e o Senado, onde a renovação será de apenas um terço dos membros.
É claro que, sem uma base de sustentação maior no Congresso, dificilmente Lula conseguirá trazer de volta os direitos que perdemos e reconstruir o que foi demolido no estado brasileiro desde o golpe contra Dilma Rousseff.
Fernando Tolentino de Souza Vieira
Administrador público (UFBA) Jornalista (CEUB) Ex diretor geral da Imprensa Nacional nos governos de Lula e Dilma (2003- 2015).
Contato: tolentino.vieira@gmail.com