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Massacres em escolas no Brasil

O caso trágico de Blumenau não constitui fato isolado e aleatório na história recente do Brasil.

18/04/2023 às 06h25
Por: Carlos Nascimento Fonte: fontesegura.forumseguranca.org.br/
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Massacres em escolas no Brasil

É preciso reconhecer que há "algo novo no ar", exigindo mobilização de autoridades políticas, profissionais da educação e da segurança pública, e obviamente do mundo acadêmico. Produzir conhecimento cientificamente fundamentado sobre o fenômeno deve ser prioridade absoluta.

O caso trágico de Blumenau não constitui fato isolado e aleatório na história recente do Brasil. Soma-se a outros assassinatos similares ocorridos em Saudades (SC), em 2021, e em Janaúba (MG), em 2017. Os três tiveram como alvo creches, vitimizando crianças e professoras. Para além deles, testemunhamos desde 2010 diversos ataques a escolas protagonizadas por alunos ou ex-alunos. A despeito das singularidades dos respectivos eventos, está em curso na sociedade brasileira nova modalidade de violência que se diferencia dos homicídios que conformam nosso cotidiano. Mesmo sendo poucos casos, pode-se afirmar que se trata de um fenômeno sociológico que está se acentuando com o tempo.

“Mass murders in schools” são recorrentes mundo afora, com destaque para a sociedade norte-americana. Não é casual que a produção acadêmica sobre o assunto nesse país seja predominante[1]. Como os estudos no Brasil ainda são incipientes, é inevitável nos referenciarmos nas evidências empíricas já obtidas pelos norte-americanos. Eis as principais resultantes de recente levantamento feito por professores da Columbia University[2] :

Os assassinos são majoritariamente homens brancos, idade média de 28 anos, com desvio padrão de 11 anos;

Quase 70% dos casos envolvem uso de armas de fogo;

Número médio de 8 vítimas por evento;

Quase 80% dos assassinos não apresentam registros anteriores de sintomas psicóticos;

Pouco menos da metade dos assassinos comete suicídio após o ato.

No que diz respeito às teorias para explicar o fenômeno, têm prevalecido abordagens que combinam dimensões psicológicas com dimensões sociológicas. Destaco, nesse sentido, a teoria elaborada por dois pesquisadores da Northeastern University, Jack Levin e Eric Madfis[3].

Denominada de Teoria da Tensão Cumulativa (Cumulative Strain Theory), caracteriza-se pela combinação de várias teorias criminológicas, a saber, teoria da tensão, teoria do controle e teoria das atividades de rotina. Explica a gênese da motivação dos agentes dos assassinatos em escolas a partir de um modelo sequencial de estágios que estruturam uma personalidade individual pautada pelo ódio e desejo de vingança. Em resumo, os autores argumentam que frustrações de longo prazo (tensões crônicas) experimentadas no início da vida ou na adolescência levam ao isolamento social e à consequente falta de sistemas de apoio pró-sociais (descontrole tensão), por sua vez, permite que um evento negativo de curto prazo (tensão aguda), seja real ou imaginário, seja particularmente devastador. Como tal, a tensão aguda inicia uma fase de planejamento, em que um assassinato em massa é fantasiado como uma solução masculina para recuperar sentimentos perdidos de controle e ações são tomadas para garantir que a fantasia se torne realidade.

Como se observa, a motivação do jovem para cometer os assassinatos resulta de sua trajetória de vida marcada pelo acúmulo de frustrações pessoais provenientes de relações sociais instáveis na família, na comunidade e na escola. A teoria reconhece, por outro lado, que esse indivíduo frustrado e tensionado não está totalmente isolado. Ele tende a se associar a grupos de pares que compartilham as mesmas experiências e frustrações pessoais, especialmente nas redes sociais da internet. Além disso, a facilidade do acesso à arma de fogo é fator de risco decisivo de “mass murders” nos EUA.

Não se deduza da minha análise que os eventos ocorridos no Brasil sinalizam a tendência da disseminação de “mass murders in schools” nos mesmos moldes da sociedade norte-americana. Ainda é prematura tal conclusão. Contudo, é preciso reconhecer que há “algo novo no ar”, exigindo mobilização de autoridades políticas, profissionais da educação e da segurança pública, e obviamente do mundo acadêmico. Produzir conhecimento cientificamente fundamentado sobre o fenômeno deve ser prioridade absoluta.

Mesmo reconhecendo tal limitação de conhecimento, algumas ações preventivas já podem ser adotadas contemplando o sistema de ensino público e privado, incluindo faculdades e universidades. Destacaria as seguintes medidas a curto prazo: a) monitoramento intenso das redes sociais por parte das polícias de modo a identificar potenciais ofensores; b) reforço do patrulhamento escolar mediante presença mais assídua de policiais militares e guardas municipais nos arredores das unidades de ensino; c) implantação de tecnologias que permitam o acionamento imediato da polícia ou da guarda municipal quando da ocorrência do fato. A médio prazo é imprescindível que as unidades de ensino estruturem programas de acompanhamento da saúde mental dos estudantes.

[1]https://www.researchgate.net/publication/324617091_Historical_Examination_of_United_States_Intentional_Mass_School_Shootings_in_the_20th_and_21st_Centuries_Implications_for_Students_Schools_and_Society

[2]  https://pubmed.ncbi.nlm.nih.gov/36303265/

[3]https://www.researchgate.net/publication/240282562_Mass_Murder_at_School_and_Cumulative_StrainA_Sequential_Model

LUIS FLAVIO SAPORI - Doutor em Sociologia pelo Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ, 2006). Foi Secretário-Adjunto de Segurança Pública do Estado de Minas Gerais no período de janeiro/2003 a junho/2007. Coordenou o Instituto Minas Pela Paz no biênio 2010-2011. Atualmente é professor do curso de Ciências Sociais da PUC Minas e coordenador do Centro de Estudos e Pesquisa em Segurança Pública.

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