Em audiência realizada na última quarta, o ministro da Educação, Camilo Santana, respondeu a perguntas de parlamentares que se queixavam de questões do Enem. Para os deputados, representantes da bancada ruralista, a anulação de questões que se referiam ao agronegócio era necessária, haja vista que contribuiriam para uma visão negativa da atividade, o que seria a expressão do “negacionismo científico” (sic) dos formuladores da prova.
Santana respondeu aos parlamentares, enfatizando a não interferência do atual governo no exame e também o fato de que o banco de dados de onde foram retiradas as questões havia sido preparado por professores contratados no governo anterior, o que demonstrava a isenção de quem elaborou a prova.
Em artigo publicado na revista “Piauí” em 2020, Tatiana Roque citou estudo do geólogo James Powell, publicado no ano anterior, que apontou que “dentre os mais de 11 mil artigos científicos publicados sobre mudança climática entre janeiro e julho de 2019, não havia um único sequer que contestasse que o planeta está ficando mais quente por causa dos gases de efeito estufa lançados na atmosfera por atividades humanas”. Apesar disso, em vídeo divulgado em 2018, Eduardo Bolsonaro perguntou, em pleno inverno no hemisfério norte, “que aquecimento global é esse?”, referindo-se à neve que marcava a paisagem ao seu redor.
O negacionismo (climático, das vacinas, da Covid, do golpe e da ditadura militar), motivo do artigo “O negacionismo no poder” citado acima, foi derrotado nas eleições de 2022. No entanto, os bolsonaristas sabem que a sua sobrevivência depende das Fake News. Por isso continuam propagando a tese que diz que cientistas, professores e acadêmicos promovem “narrativas” movidas pelo objetivo da manipulação da opinião pública.
Em 1938, o historiador John Gwyer, citado por Richard Evans, observou que as pessoas que acreditavam no opúsculo “Os protocolos dos sábios de Sião” haviam se tornado membros de um “infeliz grupo” que via complôs por todo lado. Para Gwyer, essas pessoas não eram capazes de abrir um jornal, ler um livro ou ir ao cinema “sem observar a Mão Oculta em ação, envolvendo-se em propaganda sutil, ou tentando torná-los peões de um elaborado esquema de sabotagem”.
Os supostos ardis dos judeus eram contraditórios, haja vista que não tinham impedido que fossem vítimas dos nazistas: “analisar o mundo e concluir que todos os seus problemas se devem à malignidade de um único grupo de conspiradores misteriosos”, disse Gwyer, economizava qualquer dose de reflexão. Todavia, era eficaz, pois estava fora do âmbito do discurso racional, servindo para enganar gente incapaz de distinguir entre o verdadeiro e o falso.
A bancada ruralista têm 347 parlamentares, mas, segundo dizem, são os professores que vão dominar o mundo. A tese bolsonarista tem o mesmo fundamento da nazista. Não surpreende que sejam parecidos.
Carlos Zacarias de Sena Júnior
Doutor em História, proferssor da UFBA
E-mail: zacasenajr@uol.com.br
(*) Publicado no Jornal A Tarde, (coluna de opinião), edição de 24.11.2023.