No início da tarde do último dia 9 de agosto, exatamente às 13h25, um avião da empresa Voepass Linhas Aéreas, com 62 pessoas a bordo, caiu em uma área residencial da cidade de Vinhedo, localizada a cerca de 80 km de São Paulo. Não houve sobreviventes. O voo 2283 saiu de Cascavel (PR) às 11h46 com destino ao aeroporto de Guarulhos (SP), com previsão de duração aproximada de 2h.
Desde 2007, quando um avião da TAM se chocou com um prédio ao tentar pousar no Aeroporto de Congonhas, em São Paulo, não ocorria um acidente aéreo com essa ordem de letalidade. Naquela oportunidade, o número de vítimas foi de 199 pessoas, o que tornou o evento o mais letal acidente aeronáutico em território brasileiro até hoje. Outros dois marcantes acidentes recentes são o da Gol em 2006, com 154 vítimas, e o da TAM, em 1996, com 99. O acidente da Voepass tornou-se o 6º mais letal da história da aviação comercial brasileira.
A lista dos acidentes mais fatais no Brasil é esta:
1. Air France (2009) – 228 mortos (ocorrido em zona internacional, no oceano Atlântico)
2. TAM (2007) – 199 mortos
3. GOL (2006) – 154 mortos
4. VASP (1982) – 137 mortos
5. TAM (1996) – 99 mortos
6. Voepass (2024) – 62 mortos
Segundo o CENIPA (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), ligado ao Comando da Aeronáutica), o ano de 2024 totaliza 28 ocorrências fatais e 111 fatalidades, caracterizando-se já como um ano difícil para nossa aviação civil.
A aeronave acidentada é do modelo ATR 72-500, um turboélice regional desenvolvido pela empresa franco-italiana ATR, com 14 anos de fabricação. Esse modelo é conhecido no mundo da aviação por sua capacidade de operar em aeroportos de pista curta e de difícil acesso no Brasil e em outras partes do mundo, especialmente na Ásia. A velocidade de cruzeiro do modelo é de 511 quilômetros por hora e sua autonomia de voo é de 1.324 quilômetros.
Sobre a perícia e a investigação relacionadas ao caso podemos especificar duas grandes frentes de trabalho: a primeira relacionada à identificação o mais rapidamente possível das vítimas, para que as famílias possam receber seus entes e viver o luto de forma menos traumática. A segunda é relacionada ao entendimento das causas (chamadas de fatores contribuintes pela abordagem da prevenção).
Na questão da identificação, envolvem-se peritos criminais, médicos legistas, papiloscopistas e diversos outros servidores, que seguirão protocolos internacionalmente reconhecidos, empregando, pela sequência, impressões digitais, dados odontológicos (arcada dentária) e DNA.
Na busca da causa do acidente, trabalham tanto peritos da Polícia Científica de São Paulo, em colaboração com peritos da Polícia Federal, como os peritos do CENIPA.
O Perícia em Evidência da edição 73 do Fonte Segura explica as diferenças entre a perícia oficial de natureza criminal, realizada pela perícia oficial dos estados (bem como pela Polícia Federal) e a perícia preventiva, realizada pelo órgão ligado à Aeronáutica, o CENIPA.
Na Edição 113 do Fonte Segura tratamos do acidente aéreo de 5 de novembro de 2021, que vitimou a cantora Marília Mendonça, na região mineira de Caratinga.
No início do ano, o tema já havia sido abordado na Edição 217 do Fonte Segura, com destaque para os acidentes com aeronaves ocorridos no início de 2024, e que alcançaram 12 vítimas fatais apenas no primeiro mês do ano.
Desde o acidente da Voepass, mutas informações relativas a possíveis causas apareceram. Muitas imagens captadas por aparelhos celulares de populares e por câmeras de segurança mostraram a parte final da queda da aeronave, em um tipo de movimento conhecido como “parafuso chato”. Isso permitiu a especialistas sugerirem que a formação de gelo nas asas poderia ter afetado a sustentação do avião e contribuído para o acidente, em um típico estol (perda de sustentação). A hipótese de acúmulo de gelo no perfil de ataque das asas ganhou força também pelo histórico de acidentes com o modelo, ocorridos em outros países. Naqueles episódios, o gelo exerceu um importante fator contribuinte.
O que se divulgou também é que esse modelo ATR voa “numa faixa onde tem uma sensibilidade maior ao gelo”, mas que as condições meteorológicas de sexta-feira previam a presença desse elemento “dentro das características aceitáveis para o voo“, conforme afirmou o diretor de operações da Voepass, Marcel Moura.
Informações sobre o histórico de manutenção da aeronave também circularam. Apurou-se que a aeronave enfrentou “várias paradas para manutenção desde 11 de março“. Naquele dia, após um voo de Recife a Salvador, um relatório indicou problemas no sistema hidráulico e um impacto da cauda com a pista, causando danos estruturais. O avião teria ficado parado na capital baiana por 17 dias, até 28 de março, antes de ser enviado para reparos em Ribeirão Preto. A retomada dos voos comerciais se deu apenas em 9 de julho, mas, após uma despressurização ocorrida no mesmo dia, foi necessário o retorno a Ribeirão Preto para mais consertos. A aeronave voltou a operar em 13 de julho. Finalmente teria passado por uma manutenção de rotina na noite de quinta-feira (08/08) em Ribeirão Preto, antes de alçar voo para Guarulhos.
As caixas-pretas, que na verdade são dois gravadores, um de voz e outro de dados, já foram encontradas e estão sendo examinadas. Elas são sempre fundamentais para orientar as investigações sobre as causas do acidente.
Não há prazo para a conclusão do Relatório Final do Cenipa e dos Laudos de Perícia Oficial Criminal. Quando isso acontecer, estaremos prontos para comentar.
CÁSSIO THYONE ALMEIDA DE ROSA - Graduado em Geologia pela UnB, com especialização em Geologia Econômica. Perito Criminal Aposentado (PCDF). Professor da Academia de Polícia Civil do Distrito Federal, da Academia Nacional de Polícia da Polícia Federal e do Centro de Formação de Praças da Polícia Militar do Distrito Federal. Membro do Conselho de Administração do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
fontesegura.forumseguranca.org.br | EDIÇÃO N.244
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