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Sem consentimento, STJ invalida invasão de domicílio baseada em denúncia anônima

Schietti ressaltou que, para entrar em um domicílio sem mandado, os policiais precisam de “fundadas razões para acreditar, com lastro em circunstâncias objetivas, no atual ou iminente cometimento de crime no local onde a diligência vai ser cumprida, e não mera desconfiança”.

Carlos Nascimento
Por: Carlos Nascimento Fonte: conjur.com.br/
15/10/2024 às 11h29
Sem consentimento, STJ invalida invasão de domicílio baseada em denúncia anônima

Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a mera denúncia anônima, sem outros elementos indicativos de crime, não autoriza o ingresso de policiais no domicílio do suspeito. A Corte também já estipulou requisitos para esse tipo de ação.

Assim, o ministro Rogerio Schietti Cruz, do STJ, não viu “fundadas razões nem consentimento válido” para o ingresso de policiais em uma casa, anulou provas obtidas lá dentro e absolveu um homem da acusação de tráfico de drogas.

A Polícia Militar de Minas Gerais alegou ter recebido uma denúncia anônima de tráfico de drogas dentro da casa em questão — em uma região que, segundo os PMs, era conhecida por isso.

Os agentes cercaram o imóvel. Na versão deles, a companheira do réu autorizou a entrada dos agentes no local mesmo sem mandado de busca e apreensão.

Dentro da residência, os policiais viram o homem no banheiro “tentando se desfazer” de algumas drogas. Após promover as buscas, eles encontraram 1,76 grama de crack, 2,79 gramas de maconha, 0,35 grama de sementes de maconha e cinco cartuchos de munição para arma de fogo calibre .38.

O réu foi condenado a um total de oito anos e dez meses de prisão mais multa por tráfico de drogas, posse ilegal de munições de uso permitido e falsa identidade.

Ao STJ, a defesa alegou que o processo se baseou em “elementos de informação ilícitos” obtidos por meio da invasão de domicílio.

Fundadas razões

Schietti ressaltou que, para entrar em um domicílio sem mandado, os policiais precisam de “fundadas razões para acreditar, com lastro em circunstâncias objetivas, no atual ou iminente cometimento de crime no local onde a diligência vai ser cumprida, e não mera desconfiança”.

Ele lembrou de decisão de 2021 na qual a 6ª Turma estabeleceu os requisitos para o ingresso de policiais em domicílio. Conforme o precedente, a investida deve ser registrada em áudio e vídeo. Além disso, a permissão do morador para a entrada dos agentes no imóvel deve ser registrada, sempre que possível, por escrito. Mais tarde, a 5ª Turma se alinhou a esse entendimento.

No caso, o ministro não viu comprovação do consentimento da companheira do réu para a entrada dos PMs. Para ele, “soa inverossímil a versão policial” de que ela teria permitido o ingresso de forma voluntária.

“Um mínimo de vivência e de bom senso sugerem a falta de credibilidade da versão policial. Pelas circunstâncias em que ocorreram os fatos — quantidade de policiais, armados etc. —, não se mostra crível a voluntariedade e a liberdade para consentir no ingresso”, assinalou.

O ministro ressaltou que “o senso comum e as regras de experiência merecem ser consideradas quando tudo indica não ser crível a versão oficial apresentada, máxime quando interfere em direitos fundamentais do indivíduo e quando se nota indisfarçável desejo de se criar uma narrativa amparadora de uma versão que confira plena legalidade à ação estatal”.

Na visão de Schietti, era função dos policiais demonstrar o consentimento do morador ou a “clara situação de crime permanente” dentro da casa.

“São inaceitáveis as justificativas apresentadas em certas ocasiões por alguns agentes públicos, no sentido de que o morador ou até mesmo outras pessoas que residem no imóvel autorizaram de modo espontâneo a entrada da guarnição policial na residência sem mandado judicial de busca e apreensão”, diz o advogado criminalista Raphael Henrique Dutra Rigueira, responsável pela defesa.

“Ninguém jamais irá permitir espontaneamente a entrada da polícia para revirar a sua residência sem mandado judicial de busca e apreensão, sabendo do efeito risco de ser preso em flagrante e processado perante a Justiça Criminal”, completa.

Jurisprudência vasta

A jurisprudência do STJ sobre o tema é ampla. Só em 2023, o tribunal anulou provas decorrentes de entrada ilícita em domicílio em pelo menos 959 processos, conforme mostrou a revista eletrônica Consultor Jurídico.

A corte já entendeu como ilícita a entrada nas hipóteses em que a abordagem é motivada por denúncia anônima, pela fama de traficante do suspeito, por tráfico praticado na calçada, por atitude suspeita e nervosismo, cão farejador, perseguição a carro ou apreensão de grande quantidade de drogas.

Também anulou as provas quando a busca domiciliar se deu após informação dada por vizinhos e depois de o suspeito fugir da própria casa ou fugir de ronda policial. Em outro caso, entendeu ilícita a apreensão feita após autorização dos avós do suspeito para ingresso dos policiais na residência.

O STJ também definiu que o ingresso de policiais na casa para cumprir mandado de prisão não autoriza busca por drogas. Da mesma forma, a suspeita de que uma pessoa poderia ter cometido o crime de homicídio em data anterior não serve de fundada razão para que a polícia invada o domicílio de alguém.

Por outro lado, a entrada é lícita quando há autorização do morador ou em situações já julgadas, como quando ninguém mora no local, se há denúncia de disparo de arma de fogo na residência ou flagrante de posse de arma na frente da casa, se é feita para encontrar arma usada em outro crime — ainda que por fim não a encontre — ou se o policial, de fora da casa, sente cheiro de maconha, por exemplo.

Clique AQUI para ler a decisão:

HC 904.243   

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