As Lesões por Esforços Repetitivos (LER) e os Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho (DORT) são condições que afetam muitos trabalhadores, incluindo servidores públicos. Essas doenças ocupacionais são caracterizadas por danos aos tendões, músculos e nervos, geralmente causados por movimentos repetitivos, posturas inadequadas e sobrecarga de trabalho.
No contexto do serviço público, é importante entender que os servidores também estão sujeitos a acidentes de trabalho e doenças ocupacionais. A Lei nº 8.112/1990, que dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais, aborda essa questão em seu artigo 212:
"Configura acidente em serviço o dano físico ou mental sofrido pelo servidor, que se relacione, mediata ou imediatamente, com as atribuições do cargo exercido."
Além disso, o parágrafo único deste artigo equipara ao acidente em serviço: O dano decorrente de agressão sofrida e não provocada pelo servidor no exercício do cargo; O dano sofrido no percurso da residência para o trabalho e vice-versa.
As legislações estaduais também têm previsões legais, v.g, lei 6677/94
Vamos analisar especificamente a Lei nº 6.677/94 do Estado da Bahia, que serve como um bom exemplo de como os Estados abordam a questão dos acidentes de trabalho e doenças ocupacionais no serviço público.
O artigo 160 da Lei nº 6.677/94 define acidente em serviço de forma similar à lei federal:
"Configura acidente em serviço o dano físico ou mental sofrido pelo servidor, que se relacione, mediata ou imediatamente, com as atribuições do cargo exercido."
A seguir
Art. 161 - Equipara-se a acidente em serviço, para efeitos desta lei:
I - o fato ligado ao serviço que, embora não tenha sido a causa única, haja contribuído diretamente para a morte do servidor, para redução ou perda da sua capacidade para o serviço ou produzido lesão que exija atenção médica na sua recuperação;
II - o dano sofrido pelo servidor no local e no horário do serviço, em conseqüência de:
a) ato de agressão ou sabotagem praticado por terceiro ou por outro servidor;
b) ofensa física intencional, inclusive de terceiro, por motivo de disputa relacionado com o serviço e que não constitua falta disciplinar do servidor beneficiário;
c) ato de imprudência, negligência ou imperícia de terceiro ou de outro servidor;
d) desabamento, inundação, incêndio e casos fortuitos ou decorrentes de força maior.
III - a doença proveniente de contaminação acidental do servidor no exercício de sua atividade;
IV - o dano sofrido em viagem a serviço da administração, independentemente do meio de locomoção utilizado, inclusive veículo de propriedade do servidor, desde que autorizado pela sua chefia imediata.
Parágrafo único - Não é considerada a gravação ou complicação de acidente em serviço a lesão que, resultante de acidente de outra origem, se associe ou se superponha às conseqüências do anterior.
A legislação citada estabelece que se equipara a acidente em serviço qualquer fato ligado ao serviço que contribua diretamente para a redução ou perda da capacidade de trabalho do servidor ou que exija atenção médica. Embora a lei não mencione explicitamente LER/DORT, essas condições se enquadram perfeitamente na definição de lesões que exigem atenção médica e podem reduzir a capacidade laboral.
Pois bem. Para que um evento seja considerado acidente de trabalho no serviço público, é necessário que sejam preenchidos os seguintes requisitos:
a) Ocorrência de um dano físico ou mental; b) Relação direta ou indireta com as atribuições do cargo exercido; c) Nexo causal entre o dano e o exercício das atividades laborais.
No caso específico de LER/DORT, é fundamental demonstrar que as condições de trabalho contribuíram significativamente para o desenvolvimento da doença. A responsabilidade objetiva do Estado se baseia na teoria do risco administrativo. Esta teoria postula que o Estado, ao desenvolver suas atividades, cria riscos para os administrados e, portanto, deve responder pelos danos que causar, independentemente de culpa
Vejamos.
O fundamento principal para a responsabilidade objetiva do Estado está no artigo 37, § 6º, da Constituição Federal de 1988:
"As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa."
Este dispositivo estabelece claramente a responsabilidade objetiva do Estado, sem fazer distinção entre tipos de danos ou circunstâncias específicas.
A responsabilidade objetiva do Estado se baseia na teoria do risco administrativo. Esta teoria postula que o Estado, ao desenvolver suas atividades, cria riscos para os administrados e, portanto, deve responder pelos danos que causar, independentemente de culpa.
Os tribunais superiores, incluindo o Supremo Tribunal Federal (STF), têm reiteradamente confirmado a aplicação da responsabilidade objetiva do Estado em casos de danos a servidores públicos, incluindo doenças ocupacionais.
É importante distinguir entre a necessidade de demonstrar o nexo causal (que existe) e a necessidade de provar culpa (que não existe na responsabilidade objetiva). O primeiro , o nexo causal (relação entre o dano e a atividade estatal), deve ser demonstrado. A culpa ou dolo do Estado não precisa ser provada. Eis a responsabilidade objetiva do Estado.
Na responsabilidade objetiva, há uma inversão do ônus da prova. Cabe ao Estado, se quiser se eximir da responsabilidade, provar que o dano não ocorreu por causa de sua atividade ou que houve culpa exclusiva da vítima.
Mesmo em casos de desenvolvimento gradual como LER/DORT, a responsabilidade permanece objetiva. O que muda é a forma de estabelecer o nexo causal, que pode ser mais complexa, mas não altera a natureza da responsabilidade.
Autores singulares do Direito Administrativo, como Celso Antônio Bandeira de Mello e Maria Sylvia Zanella Di Pietro, sustentam a aplicação da responsabilidade objetiva do Estado em casos de danos a servidores públicos.
A adoção da responsabilidade objetiva visa proteger o servidor, parte mais vulnerável na relação, garantindo-lhe o direito à indenização sem o ônus de provar a culpa do Estado.
Portanto, a responsabilidade do Estado nos casos de LER/DORT em servidores públicos é objetiva. Isso significa que: Não é necessário provar culpa ou dolo do Estado. Basta demonstrar o dano (a doença ocupacional) e o nexo causal com o serviço público.
O Estado só se exime se provar que não houve nexo causal ou que houve culpa exclusiva da vítima.
Não pode passar despercebido que exista corrente minoritária que defende a responsabilidade subjetiva, a posição dominante na doutrina e jurisprudência ainda é a da responsabilidade objetiva do Estado. A visão subjetiva é criticada por: Contrariar o texto constitucional. Ir contra a jurisprudência consolidada dos tribunais superiores. Potencialmente reduzir a proteção aos servidores públicos. Ignorar o dever do Estado de proporcionar um ambiente de trabalho seguro e saudável.
Portanto, embora exista esse debate, a aplicação da responsabilidade objetiva continua sendo a interpretação mais aceita e aplicada no ordenamento jurídico brasileiro para casos de doenças ocupacionais em servidores públicos
Abstraído o debate acadêmico, temos que em casos de acidentes de trabalho ou doenças ocupacionais, como LER/DORT, o servidor público tem direito a: a) Licença para tratamento de saúde; b) Readaptação funcional, se necessário; c) Aposentadoria por invalidez, em casos mais graves; d) Indenização por danos materiais e morais.
A indenização deve ser calculada considerando:
Danos emergentes: despesas médicas, medicamentos, tratamentos, etc. Podem ser arbitras, na falta desses comprovantes? Entendo que sim. O entendimento de que é possível arbitrar os danos emergentes sem a apresentação de todos os comprovantes está alinhado com o princípio da razoabilidade e a busca pela reparação integral do dano. A decisão, no entanto, ficará a critério do juiz, que avaliará o conjunto probatório apresentado no caso concreto
Lucros cessantes: perda da capacidade laboral, temporária ou permanente.
Danos morais: sofrimento, dor e impacto na qualidade de vida do servidor.
Danos estético: caso existentes e muito comuns, para que se submeteu a cirurgia.
É importante destacar que o valor da indenização deve ser proporcional ao dano sofrido e às circunstâncias do caso concreto.
Ora o Estado, devido à sua responsabilidade objetiva, é o principal responsável por indenizar e tratar casos de LER/DORT e outros acidentes de trabalho no serviço público. Mas, é essencial que os órgãos públicos invistam em medidas preventivas, como ergonomia adequada, ginástica laboral e treinamentos, para reduzir ocorrências e custos futuros. Simultaneamente, os servidores devem conhecer seus direitos e buscar auxílio médico e jurídico quando necessário, assegurando adequado suporte e compensação.
Ao concluir, permitam-me ser direto e incisivo: não deixem sua dor ser ignorada ou menosprezada! Vocês, servidores que carregam as cicatrizes do descaso, têm o direito e, ouso dizer, o dever de lutar por justiça.
A pergunta "quem vai pagar por isso?" é míope e retrógrada. Ela revela uma mentalidade arcaica que trata o servidor público como mero custo, não como o ativo valioso que realmente é.
O que precisamos é de uma revolução na forma como encaramos as condições de trabalho no setor público, embora não passe despercebido que muito tem melhorado. Não estamos falando de gastos, mas sim de investimentos Investimento em gente, em qualidade, em eficiência.
Quando o Estado oferece condições dignas de trabalho, todos ganham. Os servidores trabalham melhor, as instituições se fortalecem, os serviços melhoram. É um ciclo virtuoso que beneficia toda a sociedade.
Portanto, conclamo a todos: exijam seus direitos! Lutem por melhores condições! Não se trata apenas de vocês, mas de construir um serviço público mais forte, mais justo e mais eficiente.
Lembrem-se: cada processo, cada denúncia, cada reivindicação é um tijolo na construção de um Estado mais responsável e de uma sociedade mais equitativa.
Não recuem! Não se calem! A luta por condições dignas de trabalho é a luta pelo progresso social. E nessa batalha, meus caros, vocês não estão sozinhos. Contem comigo e com todos os profissionais do direito que entendem a importância dessa causa.
O preço quem paga somos nós!
Bel Claudio Fabiano Balthazar é um advogado registrado na OAB-BA com o número 10.901. Ele atua em processos nas mais variadas área do Direito, Além disso, sua atuação é mencionada em publicações jurídicas com publicação de artigos.
Fone: (71) 99667-1967