Jimmy Carter, 39º presidente dos Estados Unidos e laureado com o Prêmio Nobel da Paz, faleceu neste domingo (29), aos 100 anos. Sua trajetória é um testemunho de dedicação ao serviço público, diplomacia e compromisso com a paz mundial. Desde suas raízes humildes em Plains, Geórgia, até sua influência global, Carter deixou um legado duradouro que continuará a inspirar gerações futuras.

Carter foi um fazendeiro de amendoim que acabou ganhando a presidência dos Estados Unidos após o escândalo de Watergate e a Guerra do Vietnã. Ele suportou uma derrota humilhante após um mandato tumultuado e, após deixar a Casa Branca, redefiniu sua vida como um humanitário global. Se tornou referência de defesa à democracia no mundo inteiro, criticando ditaduras como a do regime militar brasileiro.

O presidente americano com vida mais longa morreu mais de um ano após entrar em cuidados paliativos, em sua casa na pequena cidade de Plains, na Geórgia, onde ele e sua esposa, Rosalynn (morta aos 96 anos em novembro de 2023), passaram a maior parte de suas vidas.

Início da Vida e Carreira Militar

James Earl "Jimmy" Carter Jr. nasceu em 1º de outubro de 1924, na pequena cidade rural de Plains, Geórgia. Filho de um fazendeiro e homem de negócios e de uma enfermeira, Carter foi inculcado desde cedo com valores de trabalho árduo e perseverança. Após completar o ensino básico em escolas públicas locais, ele prosseguiu seus estudos na Faculdade do Sudoeste da Geórgia e no Instituto de Tecnologia do Estado, culminando em um bacharelado em Ciência pela Academia Naval dos Estados Unidos em 1946.

Na Marinha, Carter serviu com distinção em submarinos no Atlântico e Pacífico, alcançando o posto de tenente e especializando-se em tecnologia de reatores e física nuclear. A morte de seu pai em 1953 o levou a retornar a Plains para assumir os negócios familiares, incluindo fazendas e uma empresa de suprimentos rurais.

Trajetória Política e Presidência

Ascensão Política

Carter iniciou sua carreira política localmente, servindo como administrador da educação, do hospital e da biblioteca de Plains. Em 1962, foi eleito senador pelo estado da Geórgia, destacando-se por sua oposição a gastos governamentais excessivos e por defender o direito de voto para negros. Reeleito em 1964, ele posteriormente se tornou governador da Geórgia em 1971, onde promoveu reformas administrativas significativas e sinalizou o fim da segregação racial no estado durante seu discurso de posse.

Mandato Presidencial (1977–1981)

Eleito presidente em 1976, Carter enfrentou uma série de desafios complexos durante seu mandato:

• Crise Econômica: A economia americana sofreu uma grave recessão marcada por alta inflação (estagflação), aumento do desemprego e uma crise energética decorrente da crise do petróleo de 1973. Carter implementou políticas para controlar a inflação e reduzir a dependência energética, incentivando o uso de fontes alternativas e a conservação de energia.

• Sequestro dos Reféns no Irã: Em 1979, uma disputa diplomática com o Irã resultou no sequestro de 52 americanos na embaixada em Teerã. A resposta de Carter incluiu tentativas de negociação e a autorizar uma operação militar que terminou em fracasso e resultou em oito mortes. O prolongado cativeiro, que durou 444 dias e se estendeu até a presidência de Ronald Reagan, manchou sua reputação e foi um fator decisivo em sua derrota na reeleição de 1980.

• Acordos de Camp David: Apesar das dificuldades internas, Carter foi aclamado internacionalmente por mediar os Acordos de Camp David em 1978, que resultaram em um tratado de paz entre Egito e Israel. Este feito diplomático destacou sua capacidade de liderança e compromisso com a paz global.

• Boicote às Olimpíadas de Moscou: Carter liderou um boicote de vários países às Olimpíadas de 1980 em Moscou, protestando a invasão soviética do Afeganistão. Embora controverso, o ato refletiu sua postura firme contra a expansão soviética.

Pós-Presidência: Diplomacia e Humanitarismo

Após deixar a Casa Branca em 1981, Carter retornou a Plains e retomou os negócios familiares. No entanto, sua verdadeira paixão pelo serviço público continuou através da fundação do Centro Carter em 1982, uma organização sem fins lucrativos dedicada a resolver conflitos internacionais, promover a saúde global e defender a democracia. Suas iniciativas incluíram missões de mediação em países como Haiti, Coreia do Sul e diversas nações africanas.

Carter também dedicou-se à educação, ministrando aulas e compartilhando sua vasta experiência em governança e diplomacia. Em reconhecimento aos seus esforços contínuos pela paz e direitos humanos, ele foi agraciado com o Prêmio Nobel da Paz em 2002.

Desafios de Saúde e Resiliência

Nos últimos anos de sua vida, Carter enfrentou diversas crises de saúde:

• Diagnóstico de Câncer (2015): Em agosto de 2015, Carter foi submetido a uma cirurgia no fígado para remoção de uma massa, que revelou um câncer metastático. Posteriormente, foi diagnosticado com melanoma no cérebro. Demonstrando uma resiliência admirável, ele enfrentou os tratamentos com otimismo e fé, eventualmente superando o câncer no cérebro.

• Quedas e Fraturas (2019): Carter sofreu múltiplas quedas em casa, resultando em fraturas no quadril e no pélvis, além de um hematoma subdural no cérebro. Cada incidente foi tratado com determinação, e ele continuou a participar de atividades públicas, mantendo seu compromisso com a construção de casas e o serviço comunitário.

• Recuperações: Mesmo após lesões graves, Carter manteve uma postura positiva, expressando gratidão por sua vida e demonstrando uma força de espírito inspiradora. Suas aparições públicas, mesmo debilitadas, refletiam sua inabalável vontade de continuar contribuindo para a sociedade.

A vida de Jimmy Carter é um testemunho de dedicação incansável ao serviço público, diplomacia e humanitarismo. Como presidente, enfrentou crises econômicas e políticas complexas com determinação, embora nem sempre com sucesso imediato. Contudo, seu legado transcende seu mandato presidencial, refletido nas inúmeras iniciativas de paz e desenvolvimento que liderou através do Centro Carter.

Sua resiliência diante das adversidades pessoais, especialmente em seus últimos anos, exemplifica um caráter fortalecido por fé e compromisso com o bem-estar coletivo. Carter demonstrou que a verdadeira liderança vai além dos títulos e cargos, residindo na capacidade de inspirar, servir e perseverar.

Jimmy Carter deixa um legado de integridade, coragem e compaixão. Seu compromisso com os direitos humanos, a paz e a justiça social continuará a inspirar gerações futuras. Que sua vida seja lembrada como um exemplo brilhante de liderança baseada em valores sólidos e serviço ao próximo.

“Estou pronto para qualquer coisa e ansioso por uma nova aventura”, disse Carter certa vez. Sua jornada terrena chegou ao fim, mas seu impacto perdurará na história e nos corações de todos que ele tocou.