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RASTREAMENTO DE PRODUTOS E ENFRENTAMENTO AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL – uma agenda de Estado

O mapeamento detalhado das cadeias produtivas possibilita interceptar transações suspeitas, identificar padrões de circulação de mercadorias ilícitas e fortalecer a cooperação entre os setores fiscal, aduaneiro, de segurança pública, justiça criminal e defesa nacional.

Carlos Nascimento
Por: Carlos Nascimento Fonte: fontesegura.forumseguranca.org.br/EDIÇÃO N.266
26/02/2025 às 10h45
RASTREAMENTO DE PRODUTOS E ENFRENTAMENTO AO CRIME ORGANIZADO NO BRASIL – uma agenda de Estado

O Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) lançou, em 10 de fevereiro de 2025, o estudo técnico Follow the Products – Rastreamento de Produtos e Enfrentamento ao Crime Organizado no Brasil, que analisa as novas fronteiras econômicas do crime organizado no país. O estudo foca em produtos de alto valor e vulnerabilidade – ouro, combustíveis, tabaco e bebidas – e nos desafios impostos por sua infiltração na economia formal.

Estima-se que esses mercados tenham gerado, a partir de 2022, uma receita de R$ 146,8 bilhões anuais para o crime organizado, enquanto o tráfico de cocaína movimentaria cerca de R$ 15 bilhões por ano.

Mercados Ilícitos e Controle Territorial

Produtos de alto consumo, como bebidas, combustíveis, tabaco e ouro, tornaram-se estratégicos para o crime organizado. Facções como PCC e Comando Vermelho controlam o comércio de produtos falsificados e contrabandeados e exploram brechas regulatórias para infiltrar esses produtos na economia formal e informal. Muitos são inicialmente lícitos, mas, ao longo da cadeia de valor, são apropriados pelo mercado ilícito por meio de sonegação fiscal, corrupção e lavagem de dinheiro.

O controle territorial é essencial para essas organizações, permitindo o domínio de rotas de tráfico e a distribuição de produtos ilícitos em áreas de baixa presença estatal. Esse modelo cria uma governança paralela, desafiando a autoridade do Estado e consolidando redes criminosas.

Fragmentação da Resposta Estatal

O grande desafio no enfrentamento ao crime organizado está na fragmentação da resposta estatal. Segurança pública, fiscalização tributária e inteligência financeira operam isoladamente, sem uma estratégia integrada. Houve avanços no combate à lavagem de dinheiro, mas sem a mesma atenção às redes criminosas territoriais e ao mercado ilegal desses ativos.

O estudo recomenda a criação de uma governança integrada para troca de informações entre os níveis federal, estadual e municipal, envolvendo Receita Federal, Polícia Federal, polícias estaduais, Guardas Municipais, Polícia Rodoviária Federal, COAF, agências reguladoras e instituições do sistema de justiça. A inteligência interinstitucional permitiria cruzar dados de rastreamento de produtos com informações fiscais e padrões de circulação ilícita, identificando operações criminosas antes que se tornem complexas e difíceis de combater pelo nível cada vez mais alto de sofisticação e profissionalização do crime organizado transnacional.

Follow the Products

O combate ao crime organizado tem se baseado na estratégia Follow the Money, focada no rastreamento financeiro do dinheiro movimentado pelas organizações criminosas. Inobstante, o estudo demonstra a necessidade de complementar essa abordagem com a metodologia do Follow the Products, voltada ao rastreamento de bens de alto valor que financiam atividades criminosas.

Nesse particular, o Sistema de Controle de Produção de Bebidas (SICOBE) foi um exemplo de rastreamento eficaz já implementado pelo Estado brasileiro. Quando ativo, aumentou a arrecadação tributária em até 40% no primeiro ano. Sua desativação, em 2016, gerou um apagão de dados e ampliou a vulnerabilidade do setor ao crime organizado. Esse cenário se agravou com o revogaço da Receita Federal em 14/02/2025, que eliminou mais de 200 normas sobre bebidas, afetando potencialmente até o Programa Rota Brasil.

A implementação de sistemas de rastreamento robustos, integrados a uma fiscalização eficiente, pode prevenir a evasão fiscal e garantir que as atividades produtivas ocorram dentro da legalidade. O mapeamento detalhado das cadeias produtivas possibilita interceptar transações suspeitas, identificar padrões de circulação de mercadorias ilícitas e fortalecer a cooperação entre os setores fiscal, aduaneiro, de segurança pública, justiça criminal e defesa nacional.

Governança Integrada para descapitalizar o Crime

Se antes o tráfico de drogas, o de armas e o de pessoas eram os principais mercados das facções criminosas, hoje a infiltração na economia legal torna o fenômeno ainda mais complexo. Facções criminosas geram parte significativa de seu capital não apenas com o tráfico, mas também por meio de um ecossistema que distorce mercados e ameaça a estabilidade econômica e institucional.

É inegável que a criação do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) pela Lei nº 9.613/1998, aprimorada pela Lei nº 12.683/2012, fortaleceu o rastreamento de fluxos financeiros ilícitos. Inobstante, essa legislação também permite que o COAF integre informações sobre produção e comercialização de bens estratégicos (ativos), sem necessidade de reformas legais, apenas com aprimoramento da governança e dos mecanismos já previstos em lei, a exemplo da Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Dinheiro (ENCCLA).

A Lei Federal nº 12.850/2013 (“Lei das Organizações Criminosas”), por sua vez, também trouxe instrumentos normativos para aprimorar a investigação e a persecução penal, permitindo maior articulação entre as polícias e o sistema de justiça. A convergência entre inteligência financeira e rastreamento de produtos pode qualificar a capacidade do Estado de desarticular redes criminosas e mitigar seus impactos na economia formal.

O rastreamento de produtos deve ser visto nesse contexto como um eixo estruturante ao enfrentamento ao crime organizado. Mais do que uma ferramenta de arrecadação, é essencial para interromper fluxos de mercadorias ilícitas, dificultar esquemas de lavagem de dinheiro (e ativos), enfraquecendo economicamente as redes criminosas e seus efeitos deletérios na sociedade.

Eduardo Pazinato - Advogado, Mestre em Direito (UFSC) e Doutor em Políticas Públicas (UFRGS). Coordenador Acadêmico da Nova Escola da Segurança Pública Municipal (NESP-M) e Associado Sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

Nivio Nascimento - Antropólogo e Especialista em Segurança Pública, com 15 anos de atuação no Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) no Brasil. Assessor de Relações Internacionais do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

 fontesegura.forumseguranca.org.br/EDIÇÃO N.266

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