Insisto em chamar a atenção do governador — comandante-geral das polícias Civil e Militar — para a necessidade de compreender e assumir plenamente seu papel de gestor das políticas públicas, especialmente nas áreas de segurança, educação e saúde.
No campo da segurança pública, é preciso destacar a responsabilidade da prevenção, atribuída exclusivamente à Polícia Militar, que exerce o policiamento ostensivo urbano e uniformizado, conforme previsto no artigo 144, § 5º da Constituição Federal de 1988. Essa função, senhores especialistas na matéria, era da Guarda Civil, exercida de forma exclusivamente preventiva, e que foi assumida pela Polícia Militar a partir de 1969, quando essa força auxiliar e reserva do Exército foi criada por decreto durante o regime militar, substituindo a antiga guarda nas funções preventivas nos municípios. A Guarda era subordinada ao Departamento de Polícia Judiciária Investigativa e Administrativa (DPJA), sendo que a execução da atividade administrativa — o policiamento preventivo — recaía sobre os guardas civis, enquanto a atividade investigativa e repressiva aos crimes cabia aos investigadores da polícia civil.
No entanto, essa função de prevenção (policiamento ostensivo e preventivo uniformizado) deixou de ser devidamente cumprida pela PM, sobretudo nos bairros periféricos. Em vez de atuar preventivamente, a Polícia Militar tem sido acionada apenas mediante chamadas, e suas ações se limitam a "incursões militares", que são ataques ou invasões repentinas de soldados em territórios considerados inimigos, ou por meio de ligações para o número 190. Trata-se de um erro primário que compromete a eficácia da política de segurança pública, desviando-se de uma política clara de segurança nacional.
A situação se agrava ainda mais quando essa própria polícia de Estado passa a rotular bairros residenciais como "territórios" ou "Complexo do Nordeste", "Palestina", criando uma perspectiva equivocada e discriminatória sobre esses espaços urbanos, em clara manifestação de preconceito contra os bairros periféricos.
Senhor governador, isso precisa ser revisto com urgência. Afinal, como já mencionado, a gestão das políticas sociais e da segurança pública urbana é uma atribuição do chefe do Executivo estadual, em parceria com o Executivo municipal.
A Polícia Militar é uma instituição com funções previstas na Constituição Federal e, por sua vez, está subordinada diretamente aos governos estaduais. Ela deve seguir as diretrizes da administração pública e atuar conforme os parâmetros legais — e não segundo uma lógica própria ou militarizada.
E é justamente aí que reside o cerne da questão. Enquanto a Polícia Militar continuar agindo de forma autônoma, como se fosse uma autarquia, pautada por uma doutrina de enfrentamento, tratando a violência urbana e os conflitos sociais como se fossem uma guerra — na qual a solução é eliminar o inimigo, tomar o território e “limpar a área” —, não haverá avanços reais.
Lamento informar, senhor governador (seja de direita ou de esquerda): enquanto 99% dos gestores aceitarem essa visão ultrapassada de segurança nacional, a segurança do cidadão e a ordem pública continuarão sendo comprometidas. A violência urbana seguirá crescendo, sem solução à vista. Ou a Polícia Administrativa — entenda-se: a Polícia Preventiva — assume o seu papel estabelecido (Art. 5º da Constituição Federal), ou o Estado continuará reproduzindo práticas ineficazes.
Se essa estrutura de segurança urbana continuar calcada em uma doutrina paramilitar, mantida como está, com todo o respeito, continuará, Excelência, a bater continência para cavalos.
por CRISPINIANO DALTRO
E-mail: crispinianodaltro@yahoo.com.br
Definição de Bairros:
Cada uma das partes em que se divide uma cidade ou vila, com o objetivo de facilitar a orientação das pessoas e possibilitar uma administração pública mais eficaz.
Definição de Território:
Definição de Território: Extensão ou base geográfica do Estado, sobre a qual ele exerce a sua soberania e que compreende todo o solo ocupado pela nação, inclusive ilhas que lhe pertencem, rios, lagos, mares interiores, águas adjacentes, golfos, baías, portos e tb. a faixa do mar exterior que lhe banha as costas e que constitui suas águas territoriais, além do espaço aéreo correspondente ao próprio território.